sexta-feira, abril 13, 2018

O que é normal e o que é disfuncional? Falamos sobre sexo.





O que é certo e o que é errado? O que é normal e o que é disfuncional?
É através dos valores/convicções que sabemos, adquirido através da experiência e conhecimento, a distinguir aquilo que está certo e aquilo que está errado. Ao conseguir identificar, esses mesmos valores/convicções, permite-nos definir o que queremos ou rejeitamos, assim como, por exemplo, definir limites saudáveis nos relacionamentos, em detrimento da ausência de limites, por exemplo: relação caótica. É através dos valores/convicções que definimos objetivos, tomamos decisões (desde as mais básicas às mais complexas), cooperamos uns com os outros, estabelecemos limites nas relações, definimos um rumo, com sentido e propósito, na nossa vida. Adquirimos esses mesmos valores/princípios na família e na sociedade. Isto é, são as mensagens que recebemos, enquanto crianças, que moldam as crenças, as convicções e são as crenças e as convicções que moldam as normas das nossas condutas; por exemplo, o respeito mutuo, a liberdade e a igualdade, o amor, a comunicação, a honestidade, a solidariedade, a responsabilidade, a ética e a moral, a importância dos afetos, etc.

Quais são os valores/convicções que aprendemos em relação ao sexo e à sexualidade?
  • Quais foram as referências sobre o sexo e a sexualidade? 
  • Os nosso valores/convicções geram qualidade de vida ou sofrimento?

Com duas décadas de aconselhamento, atrevo-me a dizer que um número muito significativo de pessoas, homens e mulheres, aprenderam na rua com os amigos e na sociedade com recurso a mitos, tabus e algumas tradições rígidas e disfuncionais. Ainda se transmitem às crianças mensagens de reprovação, principalmente, quando surgem os primeiros impulsos, de que o sexo é pecado, perversidade, motivo de vergonha e sentimento de culpa.

Afinal, o que é que está certo e o que é que está errado em relação à sexualidade e o sexo?
Segundo a Organização Mundial de Saúde define: “A sexualidade é uma energia que nos motiva a procurar amor, contacto, ternura, intimidade; que se integra no modo como nos sentimos, movemos, tocamos e somos tocados; é ser-se sensual e ao mesmo tempo sexual; ela influencia pensamentos, sentimentos, ações e interações e por isso influencia também a nossa saúde física e mental.” Acrescentaria, é uma componente integrante dos afetos, da comunicação interpessoal e do prazer.


Em pleno seculo XXI, no domínio do sexo e da sexualidade, Portugal ainda permanece em negação, refiro-me à educação sexual nas escolas, assim como, por razões históricas e culturais, teimam em existir (resistir) com o nosso consentimento, mitos e tabus, praticas e valores morais rígidos, que contribuem para distorcer e agravar as condutas em relação ao sexo e à sexualidade, à linguagem dos sentimentos e aos relacionamentos uns com os outros. Ainda se associa ao sexo e à sexualidade pecado, impureza e deve ser unicamente contemplado entre parceiros, como fator reprodutivo.

Recordo uma conversa com um individuo, que praticava sexo com varias mulheres e ao mesmo tempo mantinha o casamento, que justificava a sua conduta compulsiva desta forma: “Como homem, faço aquilo que muitos homens gostariam de fazer… faço sexo com muitas mulheres e isso é importante para mim. Sinto-me valorizado e honrado.” Para este individuo, ser homem é ter muito sexo. De acordo com este tipo de valores e tradições, o sexo normal é em excesso e a mulher personifica um objeto sexual.  Conheço também outros casos, de homens, quando adolescentes, foram conduzidos pelos seus pais, a fim de terem a primeira relação sexual com uma prostituta. Significava que o pai também era frequentador deste tipo de serviços pagos em relação ao sexo. De acordo com as tradições nesta família, é normal o homem recorrer aos serviços de prostitutas a fim de satisfazer as suas fantasias e os desejos, em muitos casos, mesmo que esta conduta vá contra os valores da relação com a esposa. Nestas famílias afetadas pela adicção ao sexo, quem normalmente solicita apoio profissional, são as esposas angustiadas e confusas com os comportamentos dos seus maridos. Recordo, uma esposa afirmar o seguinte: “Comentei a ida do meu marido às prostitutas à mãe dele, imediatamente, ela encolheu os ombros e disse: Deixa lá, cá em casa, isso é normal.” A mãe deste rapaz estava casada com o marido há mais de 40 anos. 

Acompanho nas consultas, indivíduos que identificam atitudes e comportamentos disfuncionais e compulsivos em relação ao sexo. Admitem que ao fim de alguns anos, alguns deles décadas com vidas duplas, os seus comportamentos compulsivos e repetitivos, em relação ao sexo (pornografia, prostituição, masturbação) são geradores de dor, de vergonha e culpa, ansiedade, obsessão. Ninguém nasce adicto ao sexo, todavia, algumas tradições, mitos e valores morais rígidos contribuem para o agravamento dos comportamentos, principalmente, quando surgem os primeiros impulsos em relação à sexualidade e ao sexo, refiro-me ao princípio da adolescência. Durante mais de dez anos consecutivos, facilitei grupos de terapia de homens e observava que os participantes resistiam quando o tema era sentimentos, sexualidade e sexo. Levava-me a concluir que entre homens, a linguagem dos sentimentos, dos valores da sexualidade e do sexo é oriunda daquilo que aprenderam na rua entre amigos, em vez de nas famílias e/ou nas escolas.  Em alguns contextos sociais, entre homens, onde por acaso surge o tema adicção ao sexo, alguns são perentórios, ouço com muita frequência: “Eu gostava de ser adicto ao sexo… deve ser muito bom.” Não existem adicções “boas”.

A adicção ao sexo funciona da mesma maneira, que a dependência e os efeitos prazerosos das drogas, é uma forma eficiente de dependência da recompensa e do prazer imediato; mecanismo de coping acentuada através de alterações do humor e pensamento distorcido (sistema de crenças distorcidas associadas ao sexo). A adicção ao sexo é o assunto mais importante na vida, destes indivíduos, tal como acontece com a relação entre o álcool e o alcoólico.  Gradualmente, os adictos vão perdendo o controlo das suas vidas, das suas obrigações familiares, incluindo as crianças, e profissionais, de tal forma que se revela extremamente confuso e doloroso, por exemplo; discernirem entre aquilo que é sexo saudável e o sexo disfuncional. Conheço um caso, de um individuo que afirmou o seguinte: “Como a minha mulher, recusava-se a ter sexo comigo, decidi ir às prostitutas.” Uns meses mais tarde, voltou com a tocar no assunto: “Conheci uma rapariga, com a qual tenho feito sexo com frequência, de repente, não sei o que aconteceu comigo…estou apaixonado por ela. Gosto mesmo muito dela…mas estou confuso em relação ao casamento.” Gostaria de esclarecer que esta “rapariga” é prostituta e que cobra os seus serviços. Os adictos ao sexo, passam grande parte dos seus dias a pensar (fantasiar, idealizar compulsivamente) e a elaborar cenários de possíveis novos encontros, com pessoas diferentes (seja fisicamente ou virtual, na internet/chats online) em que o fator determinante é o sexo/prazer como recompensa. Estes homens que acompanho e procuram recuperar o controlo das suas vidas, estão casados, com filhos e são engenheiros, médicos, bancários, advogados, empresários, etc.

Segundo o dr. Patrick Carnes, pioneiro na investigação da adicção ao sexo, nos EUA, define o ciclo da adicção em quatro estágios. 1. Preocupação – pensamentos, fantasias, obsessão sobre sexo. 2. Ritualização – rotinas e hábitos que reforçam o prazer/recompensa em relação ao sexo; por exemplo, estimular a excitação, sedução.  3. Comportamentos sexual compulsivo – perda do controlo sobre fantasias, obsessão e excitação sexual. 4. Desespero – Sentimento de impotência e perda de controlo surgem após períodos intensos de excitação, alguns adictos afirmam: o desespero surge quando a excitação e a obsessão desaparecem e há um choque com o contacto da realidade (vergonha, medo e sentimento de culpa) em relação à família, carreira profissional, justiça.

“Sabemos melhor do que ninguém os limites da adicção ao sexo:
A adicção ao sexo é solidão, dissimulado, hipócrita e uma fonte de satisfação pessoal egoísta.
É o oposto ao amor, é uma energia fugaz, efémera e enfraquece o verdadeiro desejo sexual.
A adicção ao sexo é impiedosa, fria e isenta de sentido de humor. Destrói os sentimentos de amor próprio e é geradora de vazios emocionais.
A adicção ao sexo distancia-nos dos sentimentos e dos vínculos/afetos de confiança e de intimidade. Contribui para desunião familiar e o caos, todos são afetados, incluindo as crianças.
A adicção ao sexo promove e estimula as dinâmicas de poder sobre os outros. Abusamos dos nossos corpos e acabamos sós, angustiados e enfermos.” Adicto ao sexo anónimo, no livro “Contrary To Love”, Patrick Carnes
Leia este artigo interessante na revista Sábado 






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