quarta-feira, março 13, 2013

Será o amor uma adicção saudável? Artigo do Dr. Robert Weiss



O Amor romântico e para onde vamos, depois de morrer, sempre se destacaram como os grandes mistérios da humanidade. É difícil definir o conceito do amor, apesar de ser diferente de pessoa para pessoa, mas é fácil, para todos nós o reconhecerem. Você com certeza sabe quando é atingido pelo amor; não é muito diferente quando é atingido pela gripe. Ao longo dos anos, milhares de homens e mulheres, têm sido desenvolvidas várias filosofias sobre o conceito do amor e/ou quando um individuo está sob o efeito do amor e as razões pelas quais é necessário para a vida, todavia, as conclusões a que se chega não acrescentam nada mais do “ Amor é a amizade em chamas”. Tais sentimentos são utilizados para a composição de excelentes letras para musicas e/ou poesia, na realidade, não se ajustam à perspectiva da psicoterapia. Ao longo dos séculos, e apesar de inúmeras tentativas quanto a uma definição concreta de um conceito sobre o amor, estas têm-se revelado infrutíferas, todavia, não há como negar; na realidade, o amor existe e é essencial para a maioria dos seres humano, tal como respirar, comer e/ou dormir.

Tradicionalmente, o amor é um estado de espírito associado ao coração, inclusivamente, muitas pessoas afirmam sentir o amor no seu peito, o que é compreensível visto o coração bater mais depressa quando estamos completamente imersos nas fantasias do amor e/ou na descoberta/procura de um parceiro/a romântico. Na realidade porém, o termo utilizado nestas circunstâncias atribuído ao “coração” não é mais do que uma metáfora de algo que representa uma parte essencial da natureza humana. O amor está dentro de nós. Nós sentimos, gostamos e sofremos por ele e com ele. Algumas vezes, pensamos que não conseguimos viver sem o amor. É capaz de fazer com que os adultos se comportem como adolescentes, e aos adolescentes sentirem que agem como uns idiotas. Perseguimos o amor, imploramos, mentimos, enganamos e roubamos por ele. Idolatramos e somos capazes, sob o efeito do amor, compor poemas épicos. Mas depois, no fundo, parece que pouco sabemos sobre o amor, ou não é?


O amor, o apego dependente e o cérebro
Devido a uma enorme divida para com a ciência moderna, actualmente  podemos concluir de uma forma inequívoca, no sentido biológico do termo, que o amor não reside nos nossos corações, mas nos nossos cérebros. Quando afirmo, “cérebro”, quero dizer sangue e órgãos. Na verdade, e de certa forma surpreendente, conseguimos localizar no cérebro, onde é que esta emoção efémera, e ao mesmo tempo maravilhosa, está localizada. Conseguimos localizar o amor, para medir a actividade no interior do cérebro, devido ao Functional Magnetic Resonance Imaging (fMRI), vulgo ressonância magnética,. Quando uma parte do cérebro é ativada, seja através de um pensamento, um movimento, uma droga, uma emoção, recorrendo ao fMRI consegue-se observar, claramente, o local onde ocorre o enorme fluxo de sanguíneo para determinada região do cérebro. Quando as pessoas sentem determinada emoção, O fMRI permite aos cientistas não só localizar e identificar as zonas do cérebro ativadas, como também permite identificar o grau de activação do cérebro, por exemplo, através da exibição de imagens de determinada pessoa, conseguindo assim monitorizar os níveis de intensidade do sentimento (Amor) ou a sua ausência. Hoje em dia, através do mapeamento e da monitorização de coisas como, a excitação sexual e o amor romântico, é um trabalho relativamente simples recorrendo à utilização da avaliação neurobiológica.

Não é de surpreender que este tipo de “mapeamento cerebral” tenha suscitado o interesse de uma serie de investigadores. Num estudo publicado pelo Journal of Neurophysiology os investigadores acompanharam a atividade cerebral de 15 pessoas (10 homens e 5 mulheres) que afirmaram estar atualmente a atravessar uma fase de “amor intensivo” há 17 meses. Recorrendo ao fMRI os investigadores comparam a atividade cerebral dos indivíduos, alternadas com uma tarefa de distração da atenção (distraction-attention task), utilizando fotografias da pessoa amada juntamente com fotografias de uma pessoa familiar, mas não amada.

Os resultados demonstraram claramente:
  • O amor romântico intenso está associado a ativação de regiões do cérebro ricas em dopamina, tais como o corpo estriado (striatum) que inclui o nucleus accumbens , também conhecido pelo “centro do prazer”
  • O amor romântico intenso também ativa regiões do cérebro associados com a motivação na obtenção da gratificação, principalmente a ínsula (área adicional do córtex cerebral), que reforça a sensação de prazer e de algumas actividades necessárias à vida. Isto é, o cérebro assegura que haja uma repetição dos mesmos comportamentos.

Com base nos resultados obtidos, a equipa de investigadores, concluiu que o amor romântico é uma motivação orientada por objectivos na vida, em vez de ser uma emoção específica. Por outras palavras, os indivíduos que estão “in love”  são fortemente motivados para estar com o seu parceiro/a amado, porque estar na presença da pessoa amada proporciona um nível elevado de recompensa neurológica, simplificando, é muito bom.

Outro estudo, publicado no Journal of Sexual Medicine, levou esta questão do amor mais adiante, estabelecendo uma relação entre o desejo sexual e o amor romântico. Este estudo analisou, em separado, os resultados de 20 ensaios obtido através do fMRI. Especificamente, cada ensaio analisou a actividade cerebral dos sujeitos envolvidos em tarefas que consistia na visualização de fotos pornográficas e outras fotos dos seus entes queridos. Depois de reunidos todos os dados, os autores do estudo, conseguiram localizar exactamente, onde e como, o desejo sexual e o amor romântico estimulam o cérebro. Constataram que tanto o desejo sexual como o amor romântico activam o corpo estriado (striatum)e o  amor romântico activa a ínsula. Assim conseguiu-se concluir que o corpo estriado é responsável pela atracção inicial, pelo desejo sexual e a ínsula é responsável para transformar esse desejo em amor. Por outras palavras, o amor é gerado e “vive no interior” do corpo estriado e na ínsula.

O amor é a cocaína das emoções
Revelou-se de grande interesse quer para os investigadores como para os profissionais clínicos, o fato de, tanto o corpo estriado como a ínsula são também as partes do cérebro responsáveis por desencadearem e gerarem a dependência. Também se observou que o mesmo fenómeno da adicção das drogas é idêntico ao processo do craving (desejo intenso e irresistível), a antecipação (anseio) e a recompensa/gratificação na dependência que ocorre com o amor. Como o professor Jim Pfaus, da Universidade da Concordia, e co-autor deste estudo, que relaciona o desejo sexual e o amor, afirma “ O amor é realmente um hábito que é formado a partir do desejo sexual, enquanto o desejo se revelar recompensador/gratificante. Funciona da mesma forma no cérebro como quando as pessoas se tornam adictas a drogas.” Esta descoberta fascinante sobre o amor romântico, as substâncias psicoactivas (a cocaína, as metanfetaminas e a heroína, etc) assim como os comportamentos adictivos (tais como o jogo, o sexo, compras, etc) partilham a mesma motivação neuro-biológica e os mesmos sistemas de activação e ajudam a explicar os transtornos obsessivos de certos indivíduos, susceptíveis à rejeição, ao sentirem-se miseráveis por causa de um amor não correspondido ou pela infelicidade no amor. Culturalmente, observamos elevados índices de homicídio, perseguição, suicídio e depressão clinica associados ao amor não correspondido, por exemplo, a violência domestica. De uma forma simplista, o amor romântico pode ser como uma adicção produtiva e saudável, idêntico ao exercício físico regular, à disciplina para uns e a uma relação apaixonada e criativa com o trabalho, para outras pessoas. Por outro lado, o amor também pode ser uma forma destrutiva de adicção, perda total do controlo em relação ao comportamento com consequências prejudiciais e destrutivas, principalmente quando o amor, é objecto de rejeição, não correspondido ou inconsistente.

Não queremos ser peremptórios, afirmando que o amor é patológico ou que todas as pessoas que se apaixonam são adictas. Para a maioria de nós, a paixão é algo positivo, feliz, saudável e uma dádiva da vida, para não mencionar a necessidade de sobrevivência da nossa espécie. A propósito, quando temos fome, sentimos um desejo intenso e irresistível para comer, e comemos por razões muito semelhantes ao amor, porque na realidade, existe uma  necessidade do individuo para sobreviver.  Assim, nem todas as pessoas que têm fome, têm um distúrbio alimentar, da mesma maneira que, nem todas as pessoas que bebem álcool ou tomam drogas para fins recreativos são alcoólicos ou adictos a drogas. A dependência ocorre quando o individuo perde repetidamente o controlo sobre as suas decisões, sobre o seu comportamento e cujas consequências são prejudiciais para a sua vida.

O que é que significa adicção ao amor?
Quando se fala sobre a adicção ao amor é importante distinguir a diferença entre escolhas saudáveis e escolhas auto destrutivas/disfuncionais adictivas. Tal como aconteceu à maioria de nós, quanto tínhamos 25 anos ou mais cedo, descobrimos que mesmo os relacionamentos saudáveis, numa fase inicial da limerância (estado cognitivo e emocional involuntário, no qual uma pessoa sente um intenso desejo romântico para com outra pessoa, é basicamente, um comportamento que a pessoa afectada pela limerância fica carinhosa, sonhadora, receptiva à sedução, sentindo uma necessidade romântica intensa). É o equivalente na linguagem quotidiana ao "estar apaixonado”, quando os desejos, pensamentos, sentimentos, escolhas da pessoa amada são a coisa mais importante à face da Terra. Esta condição pode revelar-se confusa, obsessiva e adictiva. Assim, a fase inicial de uma nova relação romântica, intensa e indiferenciada (actualmente sabemos tratar-se de um processo neuro-biológico , geradora de um êxtase emocional apaixonado, desencadeia a necessidade de estar na presença da pessoa amada. Nos relacionamentos saudáveis, este jogo de emoções, cuidadosamente sincronizado, contribui para o desenvolvimento lento, mas constante do amadurecimento da intimidade, daquilo a que podemos designar a longo prazo, de relação duradoura.
Infelizmente, para alguns indivíduos, emocionalmente menos estáveis, que sofrem de ansiedade social, depressão, apego disfuncional, desafios emocionais e ou trauma de infância, estão vulneráveis a ficar dependentes do êxtase da limerância, vulgo “estar apaixonado.” Estes indivíduos podem abusar deste tipo de estado emocional de excitação, que é inato, para escapar e/ou automedicar para evitarem sentir a tensão dos factores stressantes do dia-a-dia e/ou das suas emoções dolorosas. Na ânsia de conexão/ligação emocional, tal como acontece a todos nós, alguns destes indivíduos, emocionalmente menos estáveis, com fobia da intimidade, procuram, sucessivamente, através de vários parceiros, perpetuar o “estar apaixonado”, acreditando que este estado emocional é verdadeiro, todavia já sabemos ser transitório, em vez de ser interpretado como uma etapa para o desenvolvimento de um relacionamento/apego amadurecido, duradouro e de intimidade.

Quando uma pessoa procura, com frequência, a experiencia neuroquímica do êxtase –“ estar apaixonado”, e ao mesmo tempo, reconhece a necessidade de interromper este desejo intenso, agravado pelas consequências negativas, como por exemplo; questões dolorosas na relação, problemas no trabalho, agravamento dos sintomas de ansiedade e depressão, nesse sentido, podemos classificar, em termos clínicos, o comportamento desta pessoa como adicção ao amor. Para o tratamento é necessário, recorrer à tradicional psicoterapia psicodinâmica combinado com a terapia cognitiva-comportamental destinada a ajudar a pessoa a reconhecer os sintomas que reforçam o querer manter-se na relação, correr atrás da relação, a fugir da relação e a obsessão pela relação.
Nota: Este texto foi publicado no site http://psychcentral.com/
Acerca do Dr Robert Weiss

Referências bibliográficas:
A. Aron, H. Fisher, D. Mashek, G. Strong, H. Li, and L. Brown, “Reward, Motivation and Emotion Systems Associated with Early-Stage Intense Romantic Love,” Journal of Neurophysiology (2005) 93 : 327-337.
J.G. Pfaus, T.E. Kippin, G.A. Coria-Avila, H. Gelez, V.M. Afonso, N. Ismail, and M. Parada, “Who, What, Where, When (and Maybe Even Why)? How the Experience of Sexual Reward Connects Sexual Desire, Preference, and Performance,” Arch Sex Behav (2012) 41(1) : 31-62.
Science Daily, I Want to Know Where Love Is: First Brain Map of Love and Desire, http://www.sciencedaily.com/releases/2012/06/120620101011.htm (Jun 20, 2012).
H. Fisher, L.L. Brown, A. Aron, G. Strong, and D. Mashek, “Reward, Addiction and Emotional Regulation Systems Associated with Rejection in Love,” Journal of Neurophysiology (2010) 104 : 51-60.

Comentário: Ao longo da minha experiência no acompanhamento com pessoas com dependência emocional, vulgo codependência, constato que essas mesmas pessoas apresentam uma determinada vulnerabilidade:
  • À expressão dos afectos e ao desapego emocional,
  • À pressão social; filmes, musicas, tradições familiares, círculo de amigos,
  • Aos relacionamentos íntimos de compromisso e definição de limites,
  • Na gestão construtiva dos sentimentos dolorosos. O dependente emocional, vulgo codependente, evoca o perdão e o amor, quando na realidade nega a dor e o sentimento de raiva/frustração. São indivíduos com elevada tolerância à dor, para além dos limites saudáveis e construtivos, em prol da relação que tanto anseiam.
  • Resolução de conflitos e tomar decisões em situações tensas. Receiam a assertividade e adoptam jogos psicológicos (exemplo controlar, poder). O dependente emocional é o zelador/a em honrar o compromisso e a salvar a relação a qualquer custo. Alguns afirmam “Em nome do amor…” quando na realidade. Não existe amor genuíno e/ou confiança.
  • Alguns sintomas da dependência emocional aparentam surgir após o fim do período inicial da paixão, “lua-de-mel”, isto é, quando surgem os conflitos, as discórdias e as diferenças de crenças, experiencias, tradições, rotinas e características da personalidade.

Graças aos avanços da investigação, na era moderna, podemos concluir, ao contrário daquilo que muitos afirmam e estar desactualizado ou servir outros fins que nada têm a ver com o amor;
O amor romântico duradouro não é um sentimento.
Perante a iminência do fim do amor, o individuo adicto ao amor, pode desenvolver uma dependência emocional. Investigadores descobrem que sentimento de fim de relação está associado a ansiedade e depressão.

Quando não existe amor, genuíno e honesto, na relação o mais apropriado é terminar a relação porque prolongar o sofrimento poderá desencadear violência verbal e/ou física, vulgo violência domestica.
Investigadores da Rutgers University, New Jersey (EUA), descobriram que as áreas do cérebro que são accionadas quando uma pessoa é abandonada pelo parceiro são as mesmas que estão associadas às dependências, à depressão e à ansiedade.O estudo demonstrou que, após dois meses do fim da relação, os sentimentos que essas pessoas nutriam pelo parceiro ainda estavam intactos.Helen E. Fisher, coordenadora deste estudo e reconhecida antropóloga e investigadora na área dos relacionamentos, afirma que a rejeição cria uma espécie de dependência, que apesar de causar dor, é superável. Pôr fim à tristeza e aos pensamentos negativos não é mais do que um processo de aprendizagem.

Curiosidade: Para evitar que situações de dependência no seguimento do fim de relacionamentos afectem a produtividade dos seus empregados, o grupo Richemont, proprietário, entre outras marcas, dos relógios e joalharia Cartier, das canetas Montblanc e dos produtos Gucci, proibiu os relacionamentos amorosos entre os trabalhadores, sobretudo se ambos trabalharem lado a lado. Se não houver respeito pelo código de comportamento, os prevaricadores podem ser punidos com o despedimento ou poderão mesmo ter de mudar de local de trabalho.

“Ora, dado que se estima que mais de 80% das canções escritas versam o tema universal do amor (…)” Jornal Publico

Algumas citações sobre o amor
  • "Um homem sensato pode apaixonar-se como um doido, mas não como um tolo." François Rochefoucauld
  • "Passamos metade da vida à espera daqueles que amamos e a outra metade a deixar os que amamos." Victor Hugo
  • "O mal nunca está no amor." André Gide
  • "A experiência localiza-se nos dedos e na cabeça. O coração não tem experiência."  Henry Thoreau
  • "O amor triunfa sobre tudo, cedamos também nós ao amor." Virgílio


Sem comentários: